Durante toda minha vida me disseram que o mais importante a se fazer era virar um homem, um membro legítimo da nação do Oriente. Este era meu sonho, e ele estava muito próximo de acontecer.

Eu vivo num mundo devastado, no ano de 2178, meu nome é Marcello. Sou um espadachim, e vivo na cidade de Sariku, pertencente à nação do Oriente.

Hoje em dia o mundo é povoado por legiões de monstros, dos mais variados clãs, mas nem sempre foi assim. A história diz que no ano de 2047 um grande desastre num experimento científico num país chamado Coreia do Norte fez com que grande parte da fauna e flora do planeta se extinguissem. Uma parte dos animais e plantas sobreviventes foi alterada geneticamente, transformando-se em monstros terríveis. Enquanto que os seres humanos ao serem afetados sofreram um tipo de mutação, a qual poucos sobreviveram. Os sobreviventes notaram que tinham seus instintos melhorados, e alguns até conseguiam fazer coisas que a física dizia ser impossível. Os cientistas notaram que podiam dividir as mutações em quatro, a arte da precisão, a arte da rapidez, a arte da força e a arte da magia. E a estes quatro atributos foram declaradas as quatro classes elementares: arqueiro, espadachim, guerreiro e mago.

É claro que cada pessoa nasce com algum controle sobre um elemento, ou até mesmo dois, mas os magos são os peritos neste ramo, e ninguém pode colocar isso em dúvida. Os elementos conhecidos pelo homem são: água, fogo, terra, vento, relâmpago, gelo, luz e escuridão. Mas encontrar pessoas adeptas ao gelo e relâmpago é raridade, e os adeptos à escuridão... bem, não é bom falar neles, ao menos por enquanto.

Eu estou no último ano da minha graduação intermediária, e se eu fizer a prova final poderei escolher a minha nação. É claro que todos da cidade vão escolher a nação do Ocidente, como sempre acontece, mas os sábios dizem que a democracia sempre deve existir, por isso o líder ocidental vem na formatura dos recrutas, assim como o líder oriental também visita a formatura dos recrutas das cidades do Ocidente.

A diferença básica entre as duas nações é a ideologia, o líder oriental diz que o poder é de todos, enquanto o líder ocidental diz que sem um líder legítimo não existe a ordem, e por isso o poder deve ser concentrado. E as duas nações vivem suas culturas separadamente, ocasionalmente tendo alguns conflitos, algo raro de acontecer.

Minha ansiosidade é tão grande pelo grande dia, mas tenho que parar de pensar nisso, está quase na hora de ir pra academia e eu não terminei de tomar café ainda.

Acordei animado e me olhei no espelho. Vi um espadachim, um pouco alto, talvez uns 1,82m, magro, com corpo definido, pele um pouco bronzeada, cabelos curtos e vermelhos, da mesma cor dos olhos. Depois do acidente da Coreia, a cor dos cabelos e olhos de cada pessoa simbolizavam os elementos aos quais ela é adepta, no meu caso, o fogo.

Fiz o que sempre faço todas as manhãs, tomei banho, escovei os dentes e tomei café com minha mãe. Despedi-me dela e fui à academia, pelo mesmo caminho de sempre, virando à esquina na casa de armaduras, ouvindo o ar superior dos magos exibidos que iam flutuando pra escola (porque andar é coisa de gente fraca... cretinos), e me encontrando com a Carol na frente da casa de poções.

Ao chegar à casa de poções a Carol ainda não havia chegado, mas eu já sabia que isso aconteceria, eu vim mais cedo, como sempre, pra ver o único mago que não flutuava passando. O mago dos olhos e cabelos azuis claros, o que significava que ele era adepto ao gelo. Alguns dizem que ele também usa magia negra, mas como eu nunca vi o cabelo dele com mechas pretas não posso dizer que isso seja verdade. Pensando bem, os boatos devem ser falsos, seria muito difícil pra um mago reprimir parte de seus poderes, eles usam magia a toda hora! Mas não era isso que me chamava à atenção nele, era o fato de ele ser humilde ao ponto de andar, e ao mesmo tempo ele parecia ser tão solitário, ele nunca ia acompanhado pra academia. E... talvez ele fosse um pouco bonito também, com as características corporais de um mago, claro: magro, mais baixo que eu e inteligente. Além disso, sua pele era muito branca, o que era meio óbvio, ele não deveria gostar muito de calor, ele era adepto ao gelo. De qualquer forma ele era levemente encantador, mas nada no mundo é impossível, afinal, eu também era um pedaço de mau caminho.

Como sempre a Carol chegou furtivamente e me tirou dos meus pensamentos da pior forma possível.

-BOOOOOOMMM DIIIIAAAAAAAAAAA!!!

-Carol! Você podia ser um pouco mais escandalosa, minha mãe não deve ter ouvido. - eu disse enquanto me recompunha do susto que levei.

-Nossa, mau humor a essa hora? Quer dizer que o mago anti-social não te deu bola de novo?

-Seu apoio é reconfortante, sabia?

-Você sabe que eu te amo, mas vamos logo, porque o maguinho frio não vai passar de novo, e com o fim do ano prevejo o professor de TPM.

-Excelentes argumentos.

E fomos pra academia. Ah, a academia sempre foi um lugar prazeroso de se estar, tinha um ar de conquistas muito forte e era dividido em quatro blocos, uma arena e o salão do almoço. Como de costume fomos pro bloco C que era onde os espadachins treinavam. Com o fim do ano letivo as aulas teóricas foram ficando mais raras e estávamos treinando nossas técnicas arduamente, mas se isso era necessário pra passar na prova, eu o faria e não iria reclamar.

Eu treinei com a Carol e com mais dois amigos durante toda a manhã, e quando não aguentávamos mais, o sinal tocou. Hora do almoço. Foi um alívio ouvir aquilo, mas só de pensar que ainda tinha a tarde toda eu quase perdi a fome. Mas parecia que o almoço me reservava mais do que só comer, quando eu entrei no salão eu o vi, o mago dos cabelos azuis claros, ele estava sentado numa mesa de canto, mas o jeito que ele estava me chamou a atenção. Ele estava sentado encima da mesa com os braços meio esticados pra frente, e ele parecia muito concentrado. Além disso, pela primeira vez eu vi, de relance, mas vi, uma pequena mecha negra brotando em seu cabelo, mas foi tão rápido que eu fiquei me perguntando se eu estava ficando louco. De qualquer forma ele ainda continuava muito bonito. Nesse momento ele olhou pra mim, em seu rosto eu podia ver claramente uma dor muito forte, mas por outro lado, ele parecia envergonhado porque suas bochechas começaram a ficar muito rubras. Só aí eu percebi que eu estava parado na porta do saguão olhando pra ele, e ele me encarava de volta. Então a Carol cochichou:

-Marcello, que tal você parar com os olhares e sair da porta?

-Ah... malz.

Segui a Carol pra uma mesa. Quando eu sentei e fui olhar pra ele, eu o vi, mas ele não estava mais sentado, ele estava andando, e pelo que parecia era na minha direção.

É, não parecia, ele estava vindo na minha direção. Ele olhava fixamente pra mim. O ar da sala devia não gostar dele, porque à medida que ele vinha, faltava cada vez mais ar na sala. Até que ele parou na minha frente.

-Obrigado. - ele disse.

E foi embora. Obrigado? Eu não ia deixar isso assim. Fui atrás dele.

-Marcello! Aonde você vai? - eu ouvi a Carol dizendo.

-Já volto.

Como ele não flutuava, até onde eu sabia, ele não devia estar longe. Mas pra um mago até que ele foi rápido, quando eu o vi ele estava quase entrando no bloco A, que era o dos magos.

-Hey, espera.

Ele parou e virou rindo timidamente.

-Obrigado?

-Hum... é, normalmente significa agradecer algo.

-Eu sei o que significa! Mas...?

-Fico feliz em saber que alguém aqui olha mais do que o elemento ao qual eu sou adepto.

-E como você pode saber que eu não olho só seu elemento.

-É meio complicado esconder as coisas de alguém que tem tanta facilidade de entrar na sua mente.

Então eu vi nas mãos dele, uma placa de gelo levemente arroxeada.

-Isso é um espelho, mas ele não me mostra a face das pessoas, mas sim o que há por dentro delas.

Naquele momento todas as emoções me invadiram ao mesmo tempo. Eu estava morrendo de raiva pela invasão de privacidade, estava envergonhado pelo que ele possa ter visto, estava pasmo de saber que um mago podia fazer isso, e estava feliz, porque agora pelo menos ele sabia o que eu sentia.

-Não fique bravo comigo, por favor, eu não uso isso com frequência, só quando estou muito curioso.

-E porque você estava curioso?

-Porque eu nunca conheci ninguém que ficasse de tão bom humor ao me ver.

Agora sim eu estava envergonhado, eu fiquei mais quente do que eu normalmente era, e eu não estava acostumado a ficar envergonhado, isso era bem raro.

-Bem, então... é isso, que legal que você sabe o que eu sinto...- eu disse tentando esconder a pequena mágoa que aquilo tinha feito.

Ele chegou mais perto de mim, eu podia sentir o frio que emanava do corpo dele, eu fechei os olhos e senti... ele me abraçando? Ele me abraçou?

-Até uma outra hora.

Ele sorriu e foi pro bloco dos magos.

Eu voltei pro saguão e parecia que alguém tinha tirado o chão. Além disso, eu estava tão desorientado que quase bati na porta enquanto entrava. Ele realmente me abraçou?

-Marcello, você está bem? - a Carol disse.

-Claro, claro, estou sim, porque não estaria?

-Porque você não parece estar em um lugar a menos de 10 quilômetros de distância daqui.

-Que besteira, Carol.

Mas era verdade, eu não prestei tanta atenção no treinamento a tarde, e só percebi que estava em casa quando minha mãe me chamou pra jantar. Eu comi e logo depois fui pra cama. Era absurdo deixar que um quase desconhecido fizesse isso, ele só me abraçou, mas acho que foi esse o ponto, será que eu esperava outra coisa? De qualquer forma o sono foi chegando e amanhã seria outro dia.

Quando o dia amanheceu eu já estava no meu “ritual” matutino, como todos os dias. E assim como todos os dias eu estava parado na frente da casa de poções, esperando a Carol. E novamente o mago estava passando. E novamente eu fiquei lá, apenas esperando a Carol.

-Bom dia! - veio uma voz atrás de mim que não era a da Carol.

-Olá!

Por onde ele será que ele veio?

-Acho que ainda não me apresentei. Prazer Ângelo.

-Marcello, o prazer é todo meu.

-Preparado para o teste em duplas hoje?

-Nossa, eu tinha me esquecido completamente!

Hoje íamos fazer um teste semelhante ao teste final, porém em dupla, no qual a regra era ir duas pessoas de classes diferentes. E eu me esqueci disso, e eu ainda não tinha uma dupla. Então ele disse:

-Ah, podemos ir juntos, se você não tiver uma dupla.

Ou talvez eu tivesse.

-Você está olhando minha mente de novo?

-Hum, não, é só que eu não tenho uma dupla e perguntei se você queria ir comigo...

Deu pra sentir a mágoa que aquilo tinha feito, mas não foi intencional, até onde eu sabia pessoas adeptas à escuridão eram más pessoas, como ele conseguia se controlar?

-Desculpa, então vamos juntos.

-Tudo bem, prometo só usar magia negra quando for realmente necessário.

-É tão ruim assim?

-Para mim não, mas para os que estão à minha volta não é muito agradável.

-Bom dia meninos!

Mais uma que chega sem eu perceber, será que eu estava tão aéreo assim?

-Oi Carol, preciso te apresentar, esse é o Ângelo.

-Oi maguinho gelado, prazer, Carol.

Se olhar matasse, o olhar que eu lancei pra Carol teria sido uma espadada no peito.

-O prazer é todo meu, mas podemos ir agora? Meu professor não costuma gostar de atrasos.

Eu e a Carol concordamos com a cabeça e fomos.

Nós sabíamos que nem precisávamos ir para os respectivos blocos, fomos direto pra arena, onde os professores estavam dando as últimas orientações. O que íamos fazer era perigoso, não tanto quanto o teste final, porque teríamos que ir sozinhos, mas ainda assim era. A Carol acenou para um arqueiro amigo dela, que seria sua dupla hoje, e foi em direção a ele, enquanto que eu fiquei perto do Ângelo. Os professores passaram com um globo cheio de papéis dentro. Aqueles eram os nomes dos lugares que teríamos que ir, matar o chefe do local e voltar com uma prova de que fizemos isso. Eu esperava fortemente não pegar o Covil Sombrio, porque era de longe o mais perigoso, mas a academia dizia que era justo colocar todos os calabouços em sorteio. Ninguém nunca tinha se dado conta que o Covil Sombrio era o que tinha matado mais pessoas até hoje. Pensei nisso até que chegou nossa vez de escolher o local. Era um mago que estava segurando o globo, deveria ser o professor do Ângelo.

-Não se esqueça das últimas aulas Ângelo. - ele disse.

-Não se preocupe professor.

A resposta dele foi levemente ácida, por que ele tinha agido desse jeito? De qualquer forma, ele pegou o papel de dentro do globo.

-Bosque Perdido.

Ótimo, qualquer coisa era melhor que o Covil Sombrio. Além de que o Bosque Perdido não ficava muito longe.

-Então, vamos? - ele disse.

-Claro, só quero dar boa sorte pra Carol.

Quando eu virei pra ver a Carol, ele estava tirando o papel dela, e seu rosto ficou branco ao ver o nome que estava escrito.

-Covil Sombrio... - ela disse quase chorando.

-Calma, vamos conseguir. - eu ouvi o arqueiro dizendo a ela.

Caminhei até ela e a abracei.

-Marcello...

-Vai dar tudo certo, eu confio em você.

E fui embora com o Ângelo, com o coração apertado.

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Prefácio

Marcelo é um espadachim de fogo e seu sonho está muito próximo de se tornar realidade.
Ângelo é um mago de gelo com uma vida prestes a mudar.
Miro é um guerreiro de fogo com sérios problemas com seu rival.
Glaucos é um arqueiro de vento galanteador e de vida fácil.
Cada um deles tem um segredo, os quais estão prestes a serem revelados.

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