Eu o vi, ele parecia muito machucado e estava cambaleando, mas estava vivo. Ele me olhou e caiu.

-Não! Flutuar!!

Eu comecei a flutuar em direção a ele. Cada vez que eu chegava mais perto eu percebia o quão ferido ele estava, mas não podia ser tarde demais, simplesmente não podia!

Quando cheguei até ele, coloquei sua cabeça no meu peito, provavelmente eu estava gelado, mas isso talvez ajudasse a estancar o sangramento.

-Marcello? Marcello, me responde!

Ele não respondia, seu coração batia fracamente e apesar disso ele não largava um broche roxo que provavelmente era o símbolo de que ele havia conseguido. Meus olhos começaram a marejar, ele não podia me abandonar...

-Marcello, por favor, responde... por favor...

Uma voz ecoou na minha mente "Um sentimento puro, sincero e forte, associado à magia pode realizar milagres". Essa era a hora de observar a veracidade dessa frase, eu precisava de um milagre, precisava devolver a vida ao Marcello. Concentrei-me, concentrei cada partícula de energia que possuía, cada esperança, cada sonho, cada lembrança, cada vago segundo que passei ao seu lado estavam aqui e agora. Uma névoa branca começou a se formar à minha volta. A névoa percorreu o corpo dele, fechando seus ferimentos. Quando a névoa estava chegando ao coração ela parou e uma parede escura se formou envolta dela. A parede foi se comprimindo, até que ambas sumiram. O Marcello deu um soluço, cuspindo um pouco de sangue, deu um suspiro, abriu os olhos e logo em seguida os fechou. Seu coração parou. A mão que segurava o broche se abriu e ele caiu por terra.

Fiquei alguns segundos tentando entender o que havia acontecido.

-Marcello...?

Uma lágrima caiu em seu peito e depois dela outras vieram, não sei quanto tempo fiquei ali, não importava, minha vida foi levada e agora eu estava só mais uma vez.

Peguei o broche que estava no chão, coloquei-o no meu bolso. Segurei seu corpo em meus braços e o levei de volta para a cidade. Andei de cabeça baixa por todo o trajeto, mas era claro que as pessoas que me viam se entristeceram, era sempre assim. Por ser um costume da nação, eu o levei ao cemitério, deixei-o com o coveiro, disse seu nome e saí. Caminhei em direção à minha caverna, não prestei atenção nos monstros, se algum viesse talvez ele me deixasse ir junto com o Marcello, mas para meu azar não apareceu nenhum. Entrei na caverna.

-Luz.

Caminhar nunca tinha sido tão difícil, era como se a vida não valesse tão a pena assim, nada importava. Cheguei até a sala verde, quebrei um dos cristais e o coloquei no bolso, junto ao broche. Voltei para a cidade, mais precisamente, para o cemitério. Já estava quase na hora do corpo do Marcello ser enterrado e alguém avisou a mãe dele, pois ela estava lá. As lágrimas que corriam em seu rosto eram como fogo pra mim, doía ver aquilo, doía sentir a dor da perda de alguém... que era tão...

Colocaram-no no caixão, agora a mãe dele chorava desesperadamente e eu não havia visto a Carol, talvez ela não tivesse voltado ainda. As pessoas foram se aproximando do caixão, deixando flores. Andei até lá, olhei bem pra ele, era a sensação da mais absoluta dor, eu o perdi... coloquei o cristal ao seu lado e o broche em sua mão, virei às costas. Uma voz me perguntou:

-Esta é a prova de que ele conseguiu?

-Sim, é...

Uma mulher colocou um traje roxo, que era o uniforme que ele usaria, em seu túmulo, ao seu lado e disse:

-Neste caso, ele morreu como um membro do Oriente.

Aquilo foi demais para mim, corri de volta para casa. Abri a porta, subi para o meu quarto e deitei. Aquele era o lugar onde eu não precisava me controlar, deixe a energia negra livre e chorei. Durante muito tempo eu não consegui me controlar, meu coração doía muito e por alguma razão eu me senti responsável pela morte dele. Lembrei dos ferimentos dele, em particular o que perfurava seu peito, era isso... aquilo era magia negra!!!

Uma dor muito forte tomou conta de mim, meu coração parecia estar sendo comprimido, tentei segurá-lo dentro do peito. Minha mãe veio até a porta do quarto e me viu se contorcendo de dor.

-Ângelo!!! Acalme-se Ângelo!!! Eu sei que é difícil ver quem amamos partir meu amor, mas fique calmo! - gritou minha mãe.

Eu a abracei, as lágrimas não pararam de rolar nem sequer por um segundo.

-Está tudo bem Ângelo, ele está num lugar melhor, eu estou aqui com você agora, fique quietinho.

Eu não conseguia parar de pensar naquilo, naquela marca...

Demorou um tempo para eu consegui me recompor.

-Mãe, obrigado, mas agora eu preciso ficar um pouco sozinho.

-Tudo bem querido, te amo muito.

-Acho que você é tudo que tenho.

-Não diga isso.

-Não deixa de ser uma verdade...

-Pare com essas bobagens e tente dormir um pouco, amanhã você precisa "escolher" sua nação.

A entonação na voz dela na palavra escolher era comum a todos, ninguém escolhia de verdade, todos permaneciam na nação na qual nasceram, afinal, quem trocaria uma vida toda por algo desconhecido?

O cansaço e o sono começaram a ganhar forças à medida que o tempo passava, até que eu adormeci.

Acordei, mas parecia que eu ainda estava no mesmo pesadelo de sempre, acho que hoje nem as plantas me ajudariam. Fui para o jardim, aproveitando a sombra da manhã. Como um mago, eu precisava de energia e as plantas eram o que eu tinha de melhor já que não tinha neve por perto. Fiquei no jardim captando a energia delas, era uma sensação boa, mas nem isso me tirou a dor do peito. Voltei para dentro de casa para escovar os dentes e tomar banho. Assim que sai do banheiro ouvi a voz da minha mãe:

-Ângelo, vem tomar café, você não pode se atrasar pra cerimônia.

Ah não, eu tinha me esquecido disso, como se não pudesse ficar pior. Foi um café da manhã silencioso, minha mãe devia estar muito feliz por eu ter passado no teste, mas eu estava muito magoado com a morte dele... e isso era algo que ela estava respeitando.

-Já está pronto querido?

-Não, preciso arrumar algumas coisas.

-Ah, tudo bem querido, você só precisará se mudar pra perto da academia superior depois.

-Hum, talvez não...

-É sim, eu me informei e...

-Mãe, você se informou sobre as coisas da nação Oriental.

-É, mas...

-É.

-Você...?

-Sim.

-Por quê?

-Será melhor assim.

-Tem que ter um motivo!

-Existem vários, mas não temos tempo e eu não estou com a disposição para tal.

-Mas...

-Não vamos perder o contato, eu já me informei sobre isso, eu jamais te deixaria assim.

Ela me abraçou com força.

-Te amo meu filho.

-Também te amo mãe, muito.

-Acho melhor você arrumar suas malas rápido.

-Tudo bem.

Subi e coloquei minhas coisas numa mala, deixei-a pronta encima da minha cama. Bem, era essa a hora. Desci as escadas, minha mãe estava secando algumas lágrimas tímidas.

-Mãe, vai ser a mesma coisa.

-Prometa que você vai vir me ver.

-É claro que vou! Eu não poderia ficar sem você!

-Tudo bem, é só que... é difícil pra uma mãe...

-Também é difícil para mim, mas é o certo.

-Está bem, vamos.

Saímos de casa em direção à academia, ela estava toda enfeitada para a ocasião. A cerimônia seria no salão de almoço, este ganhara um palanque e as cadeiras estavam dispostas de frente para o palanque. Os convidados foram sentando nas cadeiras enquanto que os "formandos" iam para o fundo do palco. De relance eu pude ver em um canto um senhor já de certa idade, parecia ser um mago, tinha cabelos castanhos e estava rodeado por várias pessoas, todos eles com vestimentas azuis, provavelmente era o líder da nação Ocidental.

Atrás do palanque nos foram dadas as últimas instruções, nós ficaríamos lado a lado e o líder Oriental perguntaria a cada um a nação a qual seguiríamos, o líder da nação escolhida daria um pingente com a cor representante da nação e dois uniformes referentes à classe do "formando", depois os novos integrantes da nação do Oriente teriam uma festa no próprio local para eles e os convidados, nada foi dito sobre quem escolheria a nação do Ocidente, o que era meio óbvio, já que ninguém escolhia mesmo. Deram um sinal para que entrássemos, esta era a hora... a hora que o Marcello tanto quis...

Uma tímida lágrima desceu pelo meu rosto, eu a sequei rápido, precisava deixá-lo descansar em paz, apesar de isso ser tão difícil. Ficamos lado a lado no palanque com todos os convidados nos observando, emocionados. Era um grande momento para a grande maioria, me pergunto se ninguém pensava em pessoas como a mãe do Marcello, que provavelmente estava tão arrasada quanto eu.

A cerimônia começou, estava indo conforme o combinado e cada "Oriente" proferido pelos formandos era seguido de uma salva de palmas, até que o líder Oriental estava na minha frente. Uma moça ao lado dele já estava separando dois quimonos roxos, quando ele disse:

-Jovem mago, em qual nação você deseja ingressar?

Olhei para a minha mãe, que estava num canto, ela sorriu pra mim.

-Ocidente...

A platéia silenciou por um instante, o líder Oriental perdeu o sorriso do rosto e deu alguns passos para trás. O líder Ocidental levantou de onde estava sentado e foi até o palco. Ele tinha um olhar muito doce, surpreso, assim como todos, mas parecia muito contente. Além disso, fora fielmente seguido pelas outras pessoas de azul, havia um guarda de cada classe. Meu coração batia cada vez mais forte à medida que a distância entre nós ia se encurtando. Ele subiu no palco, ficou na minha frente e sussurrou no meu ouvido:

-Providenciarei seu uniforme mais tarde, tudo bem? Devo confessar que não esperava por isso.

Eu ri, um pouco envergonhado, mas sussurrei de volta:

-Não tem problema.

Ambos ficamos eretos frente a frente, ele tirou um pingente azul do bolso e disse:

-Eu lhe concedo este pingente para nomeá-lo membro oficial da nação do Ocidente a partir de agora.

Abaixei um pouco a cabeça e ele colocou o pingente no meu pescoço. Nós nos olhamos por um momento até que ele fez um sinal para que eu saísse do palco com ele, acho que seria o mais... sensato... a se fazer, se é que existia sensatez no que eu fiz, mas isso não importava agora, de qualquer forma eu o segui. Ficamos naquele canto até a cerimônia acabar, foi quando minha mãe veio até mim. Estava claro que ela não estava conseguindo conter as lágrimas, mas apesar da tristeza ela também sorria, afinal, eu conseguira entrar para uma nação. Nós nos abraçamos, aquele abraço de despedida, era muito ruim perder alguém pela segunda vez, mas eu não a perderia.

-Eu vou poder ver meu filho com que frequência? - Ela se dirigiu ao líder Oriental e era como se estivesse tratando da posse de algum território muito importante, pela autoridade com que falara.

-Aos finais de semana, quatro horas por dia na central de transporte. - Respondeu ele educadamente.

-Muito bem, eu entrego meu filho aos seus cuidados.

Ela me abraçou novamente, mas dessa vez as lágrimas caíram e não foram só as do rosto dela.

-Agora você precisa ir, te amo meu filho.

-Também te amo mãe, nunca vamos nos separar.

-Muito bem então, acho que você precisa pegar suas malas... desculpe-me meu jovem, mas não sei seu nome.

-Ângelo, senhor.

-Muito bem Ângelo, mas meu nome não é senhor, é Orpheu.

Eu estava confuso, não sabia se era uma represália ou uma observação.

-Ah, me desculpe... Orpheu.

-Bem melhor, acho que está na hora de irmos buscar suas malas.

-Eu já pensei nisso.

Lembrei da minha cama, do quarto e da mala, concentrei-me fielmente na mala.

-Transportar mala!

A mala apareceu na minha frente, mas quando eu a levantei ela estava leve demais. Só por curiosidade eu a abri... estava vazia. Minhas bochechas ficaram muito vermelhas, como eu pude fazer a magia errada na frente do líder da nação?! A maga que estava como guarda tomou a frente.

-Quer ajuda?

-Hum... eu não sei o que...

-Você se concentrou demais no objeto em si, precisava ser um pouco mais amplo que isso, pelo que vejo você usa magia negra, pode me mostrar onde a mala estava?

Eu arqueei a sobrancelha, indignado, como ela poderia saber disso?

-Tudo bem... eu mostro.

Deixei a magia negra livre e me concentrei mais uma vez na mala. Toquei o rosto da maga com as duas mãos e disse:

-Abra.

Agora eu estava na mente dela, era uma mente absolutamente complexa e eu estava muito perdido. A mente me mostrou uma porta escrita "Lembranças" e deixou bem claro aonde estavam as armadilhas. Eu tinha muita dó de quem tentasse entrar na mente dela contra sua vontade, a pessoa não teria chance alguma. Entrei na sala das lembranças e coloquei a minha lembrança da mala lá dentro, me concentrei e saí.

-Ah, vamos tentar de novo então, Transportar mala. - ela disse.

Minha mala não se mexeu, mas a maga ficou indicando-a para mim.

-Vamos lá, abra a mala.

Para minha surpresa desta vez as coisas estavam lá dentro.

-Nossa, obrigado.

-Por nada, se for só isso provavelmente podemos ir.

Ela sorriu e voltou ao seu lugar de guarda, o que me lembrou de reprimir a magia negra, fiz isso rapidamente, não queria ver ninguém triste. A maga me olhou com um olhar curioso quando eu fiz isso, mas acho que não era hora para perguntas. Quem tomou a decisão final foi Orpheu.

-Precisamos ir Ângelo.

-Está bem. Vemo-nos no sábado mãe. Às 15h?

-Sim, às 15h, sentirei saudades.

-Eu também.

Andamos em direção à saída. Para minha surpresa, encontrei entrando no salão a Carol.

-Ângeloooooooooooooo, eu me atrasei e... você está com um pingente azul e o líder Oriental está com você e você está com uma mala... você vai embora??!!!

As lágrimas pularam do rosto dela e ela me abraçou com muita força.

-Ângelo, não quero te perder.

-Você pode me visitar, com minha mãe, não se preocupe.

-Espero que você seja muito feliz, não nos conhecemos tão bem no final das contas.

-Foi o suficiente para eu sentir saudades de você futuramente, espero que você realmente vá me ver.

-Pode deixar, eu vou sim, mas agora preciso ir, estou atrasada para uma cerimônia que acho que já acabou.

-Eu também preciso ir, tem cinco pessoas querendo sair daqui e eu estou sendo a âncora deles.

Todos riram, mas ninguém me contradisse. Beijei-a no rosto e continuei caminhando para o portão de transporte. Ao chegarmos ao portão Orpheu mostrou o pingente dele, que era maior e mais bonito, ativando o mesmo, agora estávamos livres para ir. Dei uma última olhada para trás, eu estava abandonando meu passado e começaria uma nova vida, seria meu novo começo. Orpheu colocou a mão no meu ombro e entramos no portão, junto com os quatro guardas.

Entrei numa sala muito iluminada, era uma sala feita por magia e era a conexão entre as duas nações, provavelmente essa era a central de transporte onde eu poderia ver minha mãe. Tinha uma porta com um circulo azul encima na minha frente, era a entrada da nação do Oriente, respirei fundo. Orpheu notou isso.

-Está tudo bem?

-Sim, é só que... bem, eu devo admitir que estou com medo.

Minha cabeça estava meio baixa e era bom ser sincero com alguém. Ele colocou a mão no meu queixo e levantou minha cabeça para olhá-lo.

-Vai ficar tudo bem Ângelo, não se preocupe com isso agora. Essas pessoas que estão comigo são os diretores dos centros de ensino, sua diretora é Aglaope, a maga que te ajudou com sua magia, qualquer coisa que você precisar, pode contar conosco.

Isso me acalmou e agora eu sabia por que a maga tinha me olhado com curiosidade, ela era minha diretora e por isso ela se preocupava comigo.

-Obrigado, de verdade.

Acho que agora eu estava pronto, olhei pra trás e a maga piscou pra mim, acho que isso era um "É, eu vou cuidar de você.", eu ri.

-Bem, então vamos. - Eu disse isso com entusiasmo, agora eu queria descobrir como era o meu novo mundo.

Andamos até a porta e novamente Orpheu mostrou sua pedra para abrir passagem. Entrei na porta.

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Prefácio

Marcelo é um espadachim de fogo e seu sonho está muito próximo de se tornar realidade.
Ângelo é um mago de gelo com uma vida prestes a mudar.
Miro é um guerreiro de fogo com sérios problemas com seu rival.
Glaucos é um arqueiro de vento galanteador e de vida fácil.
Cada um deles tem um segredo, os quais estão prestes a serem revelados.

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